Vamos deixar a Vergonha de lado e falar sobre essa emoção?
A vergonha
é uma emoção universal e todos nós a sentimos. Aliás, este é um
sentimento muito importante e fundamental para exercermos a empatia e
nos relacionarmos de modo saudável. Contudo é verdade, também, que
vivemos em uma sociedade cada vez mais intolerante ao erro, à
imperfeição e às diferenças e neste cenário, no qual só o perfeito, o
ótimo, o genial é bem visto e reconhecido… Quem se arrisca? Quem
consegue lidar com a vergonha de não corresponder às expectativas, sejam
elas próprias ou alheias.
Somos seres
sociáveis, criados para nos relacionarmos e sentimos necessidade de
aceitação. Neste contexto, a vergonha é percebida como um temor à
desonra, à perda de alguma conexão, à ruptura de algum vínculo; temor de
não ser admirado e, portanto, ser indigno de relacionar-se.
As primeiras
experiências de vergonha ocorrem já na infância e podem afetar a saúde
mental ao longo do desenvolvimento persistindo até a vida adulta. Podem
ainda contribuir para desenvolvimento da depressão, ansiedade e
estresse. Um estudo realizado na Faculdade de Psicologia e Educação de
Coimbra, no decorrer de cinco anos, constatou ainda que as experiências
de vergonha na infância e adolescência funcionam como memórias
traumáticas, tornando-se centrais na identidade e história de vida.
Já vimos que
todos sentem vergonha, mas é verdade também que uns mais e outros
menos. Além disso, as pessoas atribuem diferentes conceitos à vergonha. A
pesquisadora Brené Brown, em sua pesquisa sobre o tema, ouviu pessoas
sobre o que consideravam vergonha. Em seu trabalho obteve respostas
como: vergonha é ir à falência; enfurecer-me com meus filhos; não ser
convidado para um evento. Além disso, a pesquisadora constatou
diferenças entre gêneros. Entre as mulheres vergonha estava bastante
associada ao medo da imperfeição, de nunca ser boa o bastante enquanto
que para os homens vergonha significava fraqueza, não importava onde,
vergonha era fracasso e demonstrar medo.
A vergonha
pode surgir a partir de nossas avaliações internas, de nosso
autojulgamento, mesmo que não tenhamos sido criticados. Está
relacionada, também, ao receio da quebra de regras, ao medo de não
atender às expectativas, normas e valores sociais. Como uma emoção
autoconsciente, a vergonha leva a um aumento do olhar para si mesmo, a
autovigilância do próprio comportamento que, por vezes pode se tornar
excessivo, resultando em dor e sofrimento.
A vergonha,
com o tempo, corrói a coragem. Cada vez que ficamos calados, que
recuamos, tornamos a vergonha maior e mais assustadora. Sendo assim, a
melhor forma de lidar com ela é enfrentando-a. Para isto:
- Aceite a vergonha, ela é uma emoção e seguirá fazendo parte da sua vida;
- Reconheça os sinais físicos da vergonha no corpo e as experiências, diálogos, expectativas que a desencadearam;
- Questione-se: Os medos que comandam a sua vergonha tem a ver com o que você quer ou correspondem às expectativas socialmente esperadas?
- Compartilhe sua vergonha com as pessoas que conquistaram o direito de ouvi-la, só assim será possível vivenciar experiência de acolhimento e empatia;
- Aprenda a conversar consigo de modo gentil, do mesmo modo que faria com alguém que você amasse, encorajando-o;
A tendência
natural das pessoas frente à vergonha é isolar-se e assim ela vai sendo
nutrida pelo segredo. Por outro lado, falar sobre ela a enfraquece,
permite descobrir que outras pessoas também a sentem, que o resultado de
não atender às expectativas talvez não seja tão catastrófico. Por fim, o
único antídoto contra a vergonha é enfrentá-la com coragem, mas também
com autocompaixão.
Brown, B. (2013). A coragem de ser imperfeito. Sextante.
Matos, M. S. A., Gouveia, J. A. P., Gilbert, P. (2012). Shame memories that shape who we. Coimbra.
Matos, M. S. A., Gouveia, J. A. P., Gilbert, P. (2012). Shame memories that shape who we. Coimbra.