sexta-feira, 28 de maio de 2010

O Homem e a Natureza

Ao romper do dia, sentei-me numa campina, travando conversa com a Natureza,

enquanto o homem ainda descansava sossegadamente das dobras da sonolência.

Deitei-me na relva verde e comecei a meditar sobre estas perguntas:


- Será a Beleza Verdade? - Será Verdade a Beleza?


E, em meus pensamentos, vi-me levado para longe da Humanidade.

Minha imaginação descerrou o véu de matéria que escondia meu íntimo.

Minha alma expandiu-se e senti-me ligado à Natureza e a seus segredos.

Meus ouvidos puseram-se atentos à linguagem de suas maravilhas.

Assim que me sentei e me entreguei profundamente à meditação,
senti
uma brisa perpassando através dos galhos das árvores e percebi
um suspiro,
como o de um órfão perdido.

"Por que te lamentas, brisa amorosa?" perguntei.

E a brisa respondeu:

"Porque vim da cidade, que se escalda sob o calor do sol, e os germes
das pragas e contaminações, agregaram-se às minhas vestes puras. Podes culpar-me por lamentar-me?"

Mirei depois as faces de lágrimas coloridas das flores e ouvi seu terno lamento... E indaguei:
"Por que chorais, minhas flores maravilhosas?"
Uma delas ergueu a cabeça graciosa e murmurou:

"Choramos porque o homem virá e nos arrancará e nos porá à venda
nos mercados da cidade". E outra flor acrescentou: "À noite, quando estivermos murchas, ele nos atirará no monte de lixo. Choramos porque a mão cruel do Homem nos arranca de nossas moradas nativas."

Ouvi também um regato lamentando-se como uma viúva, que
chorasse o filho morto,
e o interroguei:

"Por que choras meu límpido regato?"

E o regato retrucou:

"Porque sou compelido a ir à cidade, onde o Homem me despreza
e me rejeita pelas bebidas fortes e faz de mim carregador de seu lixo, polui minha pureza e transforma minha serventia
em imundície."


Escutei, ainda, os pássaros soluçando e os interpelei:

"Por que chorais, meus belos pássaros?"

E um deles voou para perto, pousou na ponta de um ramo e justificou:
"Daqui a pouco, os filhos de Adão virão a este campo com suas armas
destruidoras e desencadearão uma guerra contra nós, como que fossemos seus inimigos mortais.
Agora, estamos nos despedindo uns dos outros, pois não sabemos
quais de nós escaparão
à fúria do Homem.
A morte nos segue aonde quer que vamos."

Então o sol já se levantava por trás dos picos da montanha e coloria os topos das árvores,
com auréolas douradas.
Contemplei tão grande beleza e me perguntei:

"Por que o Homem deve destruir o que a Natureza construiu?"

(Gibran Kahlil Gibran, em a Voz do Mestre)

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